sábado, outubro 27, 2012

‘Sorte e Azar’: a ‘nova’ música do Barão Vermelho




Comemorando 30 anos de carreira fonográfica, o Barão Vermelho decidiu colocar o pé na estrada. Na turnê, batizada de + 1 Dose — citando o verso inicial de “Por Que A Gente É Assim?”, faixa do terceiro álbum do grupo, Maior Abandonado [1984] —, a banda passará pelas principais capitais brasileiras até março de 2013.

O Barão aproveitou a efeméride para remasterizar o seu disco de estreia, Barão Vermelho [no detalhe, a capa], que será reeditado em novembro, em CD e vinil, acrescido da demo de “Nós” — que, embora tenha sido lançada somente no supracitado Maior Abandonado, foi o primeiro fruto da parceria Frejat/Cazuza — e do segundo take de “Por Aí”. No formato digital, também estará disponível a versão em espanhol (!) de “Down em Mim”. 

Durante o processo de digitalização do álbum, o Barão teve a — desculpem: foi inevitável — sorte de encontrar uma fita K7, com a voz de Cazuza, de uma canção chamada... “Sorte e Azar”. A faixa foi excluída da seleção final do primeiro trabalho do quinteto pelo finado produtor Ezequiel Neves, que se sentia desconfortável com a palavra “azar”. Na década de 1990, em entrevista à extinta revista Bizz, Frejat revelou, aos risos:

— O Ezequiel chegou a sugerir que trocássemos o título para “Sorte ou Não”.

Com esse trunfo nas mãos, o Barão entrou em estúdio e “vestiu” o canal de voz do autor de “Codinome Beija-flor” com um belo arranjo, com direito a violões, guitarras bluesy, cordas e tudo o mais. O resultado não poderia ter sido melhor. 

Na interpretação visceral e nos versos de tons nada “pastéis”, “Sorte e Azar” corrobora o que Lobão afirmou há alguns anos: Cazuza, morto, está mais vivo do que muita gente.




Veja o vídeo (com letra) de “Sorte e Azar”. Uma dica: ouça em alto e bom som, para captar bem a voz do artista. No atual cenário da música brasileira — onde tudo oscila entre o “plastificado” e a indigência total —, simplesmente não existe mais quem cante com a intensidade e a verdade de Cazuza:






Veja também o bonito vídeo que mistura imagens de arquivo de Cazuza a cenas atuais dos integrantes do Barão Vermelho no estúdio:


Cazuza: índice remissivo





Relembrando algumas postagens anteriores — mas sempre atuais — sobre o Exagerado:









Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Codinome Beija-flor’, de Cazuza



“...o canal de voz do autor de ‘Codinome Beija-flor’...”




No dia 31 de julho de 1985, uma semana após a sua (turbulenta) saída do Barão Vermelho, Cazuza foi internado no Rio de Janeiro, apresentando febre de 42 graus. Na ocasião, pediu para realizar um teste de HIV, mas os imprecisos exames daquela época deram negativo. 

Durante o período que passou no hospital, o cantor recebia a “visita” de alguns beija-flores na janela do seu quarto. E isso o inspirou a escrever uma de suas mais belas — e metafóricas — letras: “Codinome Beija-flor”. 

A letra fala do fim de um relacionamento, sob a ótica mais sincera — e humana — possível: dependendo das circunstâncias da ruptura, não há, de fato, a menor condição de o casal se tornar “amiguinho”. E há um outro detalhe que chama a atenção: mais de uma década antes da popularização da internet, o poeta anteviu — e, o mais incrível, compreendeu — o que, futuramente, viria a ser chamado na web de... nick name.

Lançada no seu primeiro disco solo, epônimo [no detalhe, a capa], editado naquele mesmo ano, “Codinome...” teve a parceria do produtor Ezequiel Neves — por ter colaborado em alguns versos — e foi musicada pelo pianista e produtor Reinaldo Arias. Acompanhada por piano e adornada com cordas, a faixa revelou um Cazuza introspectivo, “desamado”. Bem diferente do enfant terrible dos tempos do Barão. 

Codinome Beija-flor” marcou o início da aproximação de Cazuza da MPB — que, ao lado do rock, o influenciou desde os tenros anos de sua infância.




Veja o vídeo do delicado — e tocante — dueto de Cazuza com Simone em “Codinome Beija-flor”, exibido originalmente no especial global Uma Prova de Amor, de dezembro de 1988, que, vinte anos depois, foi eternizado no DVD Pra Sempre Cazuza:






Veja também um vídeo gravado para o programa Clip Clip, no qual Cazuza cantou acompanhado pelo tecladista, cantor e compositor Nico Rezende, produtor de seu primeiro álbum solo:


Da série ‘Frases’: Jack Kerouac




Minha vida
que não me ama:
minha amada
que nunca vai me amar:

seduzo as duas...”




Os mais atentos perceberão que, embora aparentemente ácidos, os versos do poeta beat Jack Kerouac (1922 — 1969) são pura autoconfiança e otimismo: a “sedução”, no caso, é a capacidade de “contornar” qualquer situação desfavorável. E estavam impressos na contracapa da versão vinil do (bom) Só se For a Dois [1987], segundo disco solo de Cazuza. Entretanto, foram inexplicavelmente excluídos da edição em CD — “mutilando” o projeto gráfico original do álbum.

sábado, outubro 13, 2012

‘Doom and Gloom’: a nova música dos Rolling Stones



Completando meio século de carreira este ano, os Rolling Stones celebram a data com a compilação Grrr! [no detalhe, a pitoresca capa], disponível em três ou quatro CDs — que incluem 50 ou 80 faixas, respectivamente —, e também uma edição em vinil.

Além dos clássicos stonianos de sempre, Grrr! apresenta duas inéditas: “Doom And Gloom” e “One More Shot”. A primeira, aliás, já foi lançada em single e pode ser adquirida, em formato digital, através do iTunes.

E quem imaginava que os Stones ressurgiriam burocráticos, musicalmente “envelhecidos” levará um belo susto — no melhor sentido: ao lado de “Don't Stop” [2002], “Doom And Gloom” é, por assim dizer, a melhor canção que os sexagenários gravaram no século XXI. Apesar de a letra não ser nada excepcional, o (afiado) instrumental é digno do melhor da banda. 

A produção ficou sob a batuta de Don Was, que vem trabalhando com o grupo desde o ótimo Voodoo Lounge, de 1994.

“Doom And Gloom” e “One More Shot” são as duas primeiras músicas inéditas que os Rolling Stones gravam desde o seu último álbum de estúdio, A Bigger Bang [leia a resenha aqui], de 2005. O lançamento mundial de Grrr! está previsto para o dia 12 de novembro.



Veja o (controverso) vídeo de “Doom and Gloom” — contra-indicado para pessoas “fenfíveis”:

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Mixed Emotions’, dos Rolling Stones



Na ocasião de seu lançamento, “Mixed Emotions” — primeira música de trabalho do bom Steel Wheels, de 1989 [no detalhe, a capa] — foi, para os fãs dos Rolling Stones, um sopro de ar de puro, depois de álbuns fracos como Undercover [1983] e Dirty Work [1986].

Obviamente incluída na coletânea Grrr! [saiba mais aqui], “Mixed Emotions” é uma típica — e infalível — faixa dos Stones: rock com letra tolinha, mas repleto daquela manemolência que somente eles sabem fazer. E que atinge seu clímax no refrão simples, porém arrebatador.  

É uma daquelas canções que dispensam maiores explicações. Emana pura alegria de viver*.




* Por gentileza, não levem em consideração a (injustificável) roupinha de ginástica de Mick Jagger e concentrem-se na canção. Ele bem que poderia ter passado o clipe inteiro com a guitarra na mão...



Veja o vídeo de “Mixed Emotions:


Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Moon Is Up’, dos Rolling Stones



A produção ficou sob a batuta de Don Was, que vem trabalhando com o grupo desde o ótimo Voodoo Lounge, de 1994




Em entrevista incluída nos extras do DVD quádruplo Four Flicks [2003], o guitarrista Keith Richards revelou:

— Temos verdadeiras montanhas de coisas inacabadas. Sem contar as faixas obscuras que adoramos e que gostaríamos de retomar. Mas precisaríamos ter tempo para fazer isso.

Bem, com 50 anos de carreira nas costas, podemos imaginar não apenas as (incontáveis) canções que a banda não conseguiu finalizar, como também excelentes faixas que chegaram a ser lançadas — mas que não obtiveram a visibilidade merecida. Um dos DVDs do supracitado box Four Flicks, aliás, registra um show do grupo no tradicional Olimpia, de Paris, cujo repertório é formado majoritariamente por lados B. E é excelente.

Um exemplo de “pérola perdida”, conhecida apenas pelos fãs ardorosos da banda (oi?) e que provavelmente jamais foi executada ao vivo é “Moon Is Up”, do já mencionado Voodoo Lounge [no detalhe, a capa]. Sob todos os aspectos, “Moon Is Up” é algo peculiar no repertório dos Rolling Stones: desde a guitarra “limpinha” do riff de introdução até uma surpreendente bateria eletrônica tocada por Charlie Watts, passando por pedais de timbres variados, violões e até por um igualmente inesperado solo de... acordeon (!). 

Vale destacar também a (belíssima) letra, que é puro lirismo — totalmente fora do escárnio habitual dos Rolling Stones.

Em suma, é inacreditável como “Moon Is Up” não tenha sido regravada por algum outro intérprete — ou pela própria banda — ao longo desses dezoito anos.



Veja o vídeo de “Moon Is Up” que, embora fan made, é de primeira:


Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘You Can't Always Get What You Want’, dos Rolling Stones


O óbvio ululante: “You Can't Always Get What You Want” é um dos maiores clássicos da discografia dos Rolling Stones. Ponto. Lançada inicialmente como lado B de outro clássico — a fantástica “Honk Tonk Women” —, a faixa foi posteriormente incluída em um dos melhores álbuns da banda: Let It Bleed, de 1969 [no detalhe, a capa].

Em seus quase oito minutos (!) de duração, “You Can't Always Get What You Want” passeia por vários estilos. A introdução traz um coral de igreja (!), que é sucedido por uma arranjo folk, até prosseguir em um crescendo até a bombástica segunda parte, com direito a orquestra, percussão com molho de soul music, solo de piano e por aí vai. 

Utilizando uma linguagem cifrada, a letra faz uma crítica social à Inglaterra da época — citando o exemplo do tal sr. Jimmy, um idoso que estava esperando na fila para retirar uma simples receita médica. E também fala sobre drogas e desilusão. 

Contudo, apesar de uma certa esperança (“Mas, se você tentar, / às vezes, pode encontrar o que precisa”), trata, essencialmente, da resignação que qualquer pessoa precisa ter — até mesmo por uma questão de dignidade — diante de um revés. Nesse sentido, a mensagem é transmitida de modo perfeito. Do tipo: “Na vida, não se pode vencer sempre”. Ou: “Não se pode ter tudo”. 

E é absolutamente natural que seja assim.



Ouça “You Can't Always Get What You Want: