quarta-feira, janeiro 20, 2016

Sting e Peter Gabriel farão turnê juntos



Por essa ninguém esperava: Sting e Peter Gabriel anunciaram que farão uma turnê juntos. Com início previsto para 21 de junho, em Ohio, a Rock Paper Scissor já tem 19 datas agendadas nos EUA e no Canadá.

O nome da turnê foi inspirado na brincadeira (“Pedra, Papel, Tesoura”) utilizada pela dupla para escolher o repertório. Na foto de divulgação, os músicos não perderam a piada.

A exemplo do que ocorreu nos shows que Sting empreendeu com Paul Simon entre 2014 e 2015, não há nenhuma informação sobre o registro da turnê em CD/DVD.




Embora já tenham participado juntos de vários eventos, Sting e Peter Gabriel, até o momento, jamais colaboraram em estúdio. Contudo, é possível observar conexões entre a música dos dois britânicos. Lançada por Gabriel no bem-sucedido So [1986], “Mercy Streey”, acompanhada por um insuspeitado triângulo (!), não soaria deslocada em um álbum do ex-Police. A bem da verdade, até as vozes de ambos guardam certa semelhança:

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Where Are We Now?’, de David Bowie



Em 08 de janeiro de 2013, dia em que completou 66 anos, David Bowie pregou um susto em todo mundo. Após um silêncio de quase uma década — no qual se submeteu a uma cirurgia cardíaca —, lançou uma música nova, pegando de surpresa até a sua assessoria de imprensa.

A serena “Where Are We Now?” era o retrato de um homem nostálgico passeando pelas ruas de Berlin, onde viveu entre 1976 e 1979. Vários pontos da cidade, inclusive, citados na letra.

A faixa era a prévia do roqueiro The Next Day, que chegaria às prateleiras dois meses depois. Diferentemente do experimentalismo dos anos anteriores, Bowie concebeu um disco básico, “tradicional” — para os seus padrões — e com muitas guitarras. E a citação a Berlin no primeiro single não é isolada: a capa [no detalhe] evoca a arte do clássico “Heroes” [1978], segunda parte da chamada “trilogia de Berlin”.




Curiosamente, na letra de “Where Are We Now?”, Davie Bowie se define como um “homem perdido no tempo” que se encontra… “caminhando com os mortos”:

sábado, janeiro 16, 2016

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Sue (Or In a Season of Crime)’, de David Bowie



Duas canções já haviam sido lançadas em single: ‘Sue (Or In a Season of Crime)’ (…)




Ambas regravadas em ★, “Sue (Or In a Season of Crime)” e seu lado B, “'Tis a Pity She Is a Whore”, já haviam sido editadas em single por David Bowie. Eram as duas faixas inéditas da coletânea Nothing Has Changed, de 2014. Gravada na companhia da orquestra de Maria Schneider [que aparecer no detalhe, ao lado do cantor], “Sue...” já indicava o desejo de Bowie de se aproximar do jazz — o que, de certa forma, veio a se materializar em seu último álbum.

Na ocasião, uma matéria do jornal francês Le Monde apontava a (inegável) semelhança entre a melodia de “Sue...” e a de “Cais”, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos. Logo após a publicação, Maria Schneider, coautora da faixa, enviou uma elegante mensagem para Bastos, argumentando que “embora tenha enorme apreço” pela composição da dupla, não teve intenção de fazer referência a ela.

Bastos afirmou que ouviu a gravação de Bowie antes de ler o artigo e não percebeu semelhança com “Cais”. Voltou a ouvir depois de ler a reportagem e, dessa vez, notou sequências harmônicas e notas parecidas, mas “nada que possa ser considerado plágio”. Através de sua assessoria de imprensa, Milton também reconheceu que as duas músicas são “parecidas”. Contudo, assumiu a mesma postura de seu parceiro.

A letra de “Sue (Or In a Season of Crime)” já apresenta menções à doença (“Sue, a clínica telefonou / o raio x está bom”) e à morte (“Sue, você falou que queria escrever ‘Sue, a Virgem’ / na sua lápide / para o seu túmulo”, em uma tradução livre). E, apesar do arranjo classudo, tradicional, a narrativa tem um inesperado desfecho rodrigueano: ao descobrir um bilhete de Sue informando que iria fugir com outro, o eu-lírico, durante um passeio de trem, a atira “nas ervas daninhas”, matando-a.




Veja o vídeo oficial da primeira gravação “Sue (Or In a Season of Crime)” — amplamente superior à versão regravada em ★:

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Cais’, de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos



(…) uma matéria do jornal francês Le Monde apontava a (inegável) semelhança entre a melodia de ‘Sue...’ e a de ‘Cais’...




Segunda faixa do estupendo Clube da Esquina, de 1972 [no detalhe, a capa], “Cais”, além da exuberante melodia de Milton Nascimento, apresenta inspirada letra de Ronaldo Bastos, que pode ser compreendida como o relato de um relacionamento encerrado porque uma das partes precisava de “liberdade” (“Para quem quer se soltar / invento o cais”).

Ainda assim, o narrador se mantém firme em suas convicções (“Para quer quem me seguir / eu quero mais / tenho o caminho do que sempre quis”), se mostra aberto a novas possibilidades (“E um saveiro pronto para partir”) e não abdica de seus sonhos (“Invento em mim o sonhador”).




Milton abriu o DVD ao vivo Uma Travessia — 50 Anos de Carreira [2013] com uma magnífica versão de “Cais”. E não abriu mão de sentar ao piano para executar o belo tema instrumental que encerra a gravação original — e que retorna em “Um Gosto de Sol”, também de Clube da Esquina:

quinta-feira, janeiro 14, 2016

Em ‘Blackstar’, David Bowie escreve o seu próprio réquiem


CD
(Sony Music)
2016


No dia 08 de janeiro, data em que completou 69 anos, David Bowie editou (que tornou-se imediatamente conhecido como Blackstar), seu 25º álbum de inéditas, já disponível no iTunes e em serviços de streaming como o Deezer e o Spotify — a edição física nacional ainda encontra-se em pré-venda. Na ocasião, tanto o público quanto a imprensa sequer suspeitaram que esse seria o seu último trabalho — o cantor faleceu dois dias depois, após 18 meses combatendo em total sigilo um câncer de fígado. Embora a necrofilia seja, infelizmente, uma realidade, o seu desaparecimento não faz com que o disco se torne “melhor”. Contudo, o desenlace ajuda a elucidar os “enigmas” espalhados por Bowie nas (experimentais) sete faixas que compõem o disco.

A capa apresenta uma estrela negra em um fundo branco, representando graficamente o título do álbum. Nas lápides, todos sabem, estrelas indicam a data de nascimento. Entretanto, se o símbolo é negro, provavelmente indicam uma espécie de... “renascimento” ocorrido post mortem. O nome do artista, aliás, é “escrito” através de partes dessa mesma estrela. Vale observar que, em 49 anos de carreira discográfica, foi a primeira vez em que a imagem de Bowie não aparece na capa de um trabalho seu.

Do ponto de vista sonoro, a ordem, segundo o produtor Tony Visconti, era “evitar o rock”. De fato, músicos de jazz foram arregimentados para as gravações — o quarteto de Donny McCaslin — e, evidentemente, elementos jazzísticos permeiam em sua totalidade. Todavia, é um equívoco classificá-lo como “um álbum de jazz”. Bowie, todos sabem, sempre passou ao largo de qualquer obviedade — e agora não seria diferente agora. Outro detalhe curioso é a onipresença do saxofone de McCaslin no disco, considerando que o sax foi o primeiro instrumento do Camaleão. “No início, eu não sabia se queria ser um roqueiro ou John Coltrane”, declarou certa vez.

Duas canções já haviam sido lançadas em single: “Sue (Or In a Season of Crime)” e “'Tis a Pity She Is a Whore”, as inéditas da compilação Nothing Has Changed, de 2014. Já “Girl Loves Me”, que emula a batida do hip hop (!), é cantada, em parte, no dialeto ficcional Nadsat, que mistura o russo com o inglês, utilizado no livro Laranja Mecânica. E repete inúmeras vezes uma pergunta, no mínimo, estranha: “Where the fuck did Monday go?” (“Onde foi parar a porra da segunda-feira?”, em uma tradução livre). Bowie faleceu em um domingo…

A emoção transborda nas duas faixas que encerram o álbum. Na suave “Dollar Days”, Bowie brinca com as palavras: “I’m dying to (...) / fool them all again and again” (“Estou louco para (…) enganá-los a todos de novo e de novo”). Contudo, no final, ele canta repetidamente “I'm dying to” que também pode significar... “estou morrendo”. E é impossível não se comover ao ouvir o verso: “Não acredite, nem por um segundo / que estou esquecendo você”. Por sua vez, “I Can't Give Everything Away”, que finaliza o trabalho, apresenta, na introdução, um trecho da instrumental “A New Career In a New Town”, do clássico Low [1977]. A letra trabalha com antíteses (“Vendo mais e sentindo menos / dizendo ‘não’, mas querendo dizer ‘sim’ (…) / Essa é a mensagem que deixei”). E, cantando como nunca, se despede como quem se desculpa, em um refrão tão simples quanto… arrebatador: “Não posso revelar tudo”.

Com , David Bowie escreveu o seu próprio réquiem. Provavelmente a música popular jamais viu um artista, estando ciente de que lhe restava pouco tempo, produzindo com tamanha lucidez e planejando cada etapa de modo tão meticuloso. Bowie não nos deixa dúvidas de que sempre teve controle total sobre a sua obra. Até o fim.



Divulgado em novembro de 2014, o vídeo da faixa-título — de quase dez minutos de duração (!) — é um praticamente um curta-metragem. Nele, Bowie criou uma nova personagem, que batizou que Buttom Eyes (Olhos de Botão), talvez se inspirando na tradição da Grécia Antiga de se colocar moedas nos olhos dos mortos. Apesar dos arabescos, a segunda parte de “Blackstar” adquire, na segunda parte — quase na metade — um tocante (e quase messiânico) acento soul. Tudo leva a crer que se autointitular “uma estrela negra” alude à própria mortalidade. E a imagem da caveira de um astronauta — uma provável referência a outra personagem, Major Tom — só reforça essa ideia





Lançado dois dias antes do álbum, o impactante vídeo de “Lazarus” (o discípulo ressuscitado por Jesus Cristo, de acordo com o Novo Testamento), segunda faixa de trabalho, permanecerá na mente dos fãs de Bowie por muitos e muitos anos. Mais uma vez, Buttom Eyes se faz presente, mas, dessa vez, em um leito hospitalar (!). Após a notícia do desaparecimento do artista, a letra tornou-se clara como água: “Olhe aqui / estou no Céu / tenho cicatrizes que não podem ser vistas (…) / Olha aqui, cara / estou em perigo / não tenho nada a perder”. E, enquanto canta, seu corpo parecer querer levitar, mas é impedido por mãos femininas que “brotam” de baixo da cama — os possíveis laços familiares. Em um outro momento, ele já aparece de pé, sem a venda nos olhos, e tenta escrever algo — uma carta de despedida? Mas se detém. Pensa. E recomeça. Após terminar, um envelhecido Bowie afirma que “será livre” — do calvário da sua enfermidade, presume-se. E se refugia lentamente dentro de um armário — que pode muito bem representar um caixão...

terça-feira, janeiro 12, 2016

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Fame’, de David Bowie



Durante as gravações do álbum Young Americans — um mergulho no universo da soul music —, em 1975, no estúdio Record Plant (Nova York), David Bowie e banda trabalhavam em um cover de “Foot Stoppin'”, faixa de 1961 do grupo Flares. E o guitarrista Carlos Alomar criou um riff que, na opinião do cantor, seria um “desperdício” se fosse utilizado em uma canção alheia.

Dias depois, John Lennon apareceu no estúdio, como fazia habitualmente, e Bowie mostrou a ele o riff de Alomar. Lennon rapidamente aprendeu a sequência e ficou tocando em um canto, grunhindo algo como “aim, aim”. Até que, do nada, o ex-beatle murmurou a palavra mágica: “Fame”.

Quando ouviu, Bowie deu um pulo: “É isso! ‘Fame’! O John acaba de nos ajudar a compor a canção!”

Lennon continuou tocando a guitarra rítmica e, em cerca de vinte minutos, a banda finalizou a base da faixa. Naquela mesma noite, em casa, Bowie escreveu a letra, se orientando pelo conceito de “fama”.

No dia seguinte, John retornou ao estúdio. E aprovou o resultado final de sua “parceria” com Bowie e Carlos Alomar:



Veja o vídeo oficial de “Fame:

Da série ‘São Bonitas as Canções’: ‘Let's Dance’, de David Bowie


Em 1983, David Bowie encontrava-se em estúdio gravando um novo álbum, até então sem título, sob a batuta do produtor Nile Rodgers. Um belo dia, Bowie mostrou uma nova canção — “descartável”, segundo a avaliação do músico inglês — para Rodgers:

Olha, tenho aqui uma coisinha chamada “Let's Dance”. É bem caretinha, mas acho que dá para entrar como algum lado B, só para encher linguiça.

Após ouvir a música, o guitarrista do Chic disse:

Não, deixa ela comigo.

O resto é história. Em entrevista concedida em 1990, o cantor comentou com entusiasmo:

Rodgers fez o arranjo e mudou completamente a música, criando um “monstro”, uma verdadeira obra-prima para as pistas! Algo que eu nunca poderia imaginar!

Além de se tornar a faixa-título do álbum [no detalhe, a capa], “Let's Dance” foi um dos maiores sucessos comerciais da carreira de Bowie:



Veja o vídeo oficial de “Let's Dance:

segunda-feira, janeiro 11, 2016

David Bowie (1947 — 2016)



Eu era apenas um menino quando ouvi falar em David Bowie pela primeira vez. E foi, pasmem, em um divertido comercial da Pepsi, veiculado em meados da década de 1980. No anúncio, Bowie era um cientista que introduzia várias fotos — e até um salto alto — de beldades em uma máquina que criaria a “mulher ideal”. Iniciado o processo, o “professor Pardal” esbarra no refrigerante e causa uma pane instantânea. Em meio à fumaça, sai de dentro do equipamento a sua tão desejada criatura: Tina Turner.

A canção tema era a infalível “Modern Love”, faixa de Let's Dance [1983]. E, apesar da minha pouca idade, percebi que estava diante de algo muito especial — tanto que é uma das minhas preferidas de Bowie até hoje. Mais uma vez, ficava claro que a canção pop poderia ser algo profundo, sem abandonar o seu caráter infeccioso. E comover.

Somente anos depois vim a conhecer a fase Ziggy Stardust e a trilogia Low [1977], “Heroes” [1978] e Lodger [1979]. E passei a admirar até títulos pouco celebrados de sua discografia, como o eletrônico Earthling [1997]. Sem nenhum favor, era um mais imprevisíveis músicos de que se tem notícia. Poucos, pouquíssimos tiveram tamanha coragem para se reinventar tantas vezes (quem se lembra, por exemplo, do Tin Machine?).

Bowie lançou o seu 25º — e derradeiro — trabalho, Blackstar, há exatos três dias (!), quando completou 69 anos de idade. Chegou a gravar dois vídeos do álbum (a faixa-título e “Lazarus”). E, até então, nenhum veículo jornalístico do planeta havia informado que o cantor se encontrava em tratamento contra um câncer há 18 meses. Por tudo isso, a notícia de seu desaparecimento chocou a todos nas primeiras horas da manhã de hoje.

Na supracitada “Modern Love”, há um curioso verso que diz: “Mas eu nunca aceno adeus”. Não há a menor dúvida quanto a isso. Descanse em paz, Camaleão.



Veja o comercial da Pepsi, estrelado por David Bowie e Tina Turner nos anos 1980




e o vídeo oficial da bela “Modern Love”: